EM BREVE
AMOR DIVINO
13:1-13
A colocação desta passagem de exaltação ao amor, a seguir à meditação sobre os dons espirituais, não aconteceu por acaso. Na Igreja de Corinto, havia muita presunção, muita discussão, que poderia ser superada se houvesse no coração daquela gente um lugar, pequenino mesmo, para o amor cristão.
As qualidades que porventura tinham, provadas perante Deus, eram de pouco valor, porque lhes faltava o amor. O amor é essencial na vida do crente. Jesus mencionou em primeiro lugar a necessidade do cristão amar a Deus acima de todas as coisas. Colocar em nível bem próximo ao primeiro mandamento um segundo que recomenda amar o próximo como a nós mesmos (Mateus 5:43-48; 22:35-39). Vida cristã sem amor nem é vida nem é cristã.
Existem no Novo Testamento três tipos de amor
1. Éros
Designa especialmente o amor desejo, o amor sensual. Desejo não apenas do homem pela mulher, mas também por qualquer objecto digno de ser possuído. É um amor possessivo, sem capacidade de renunciar aos seus próprios interesses.
2. Philia
Designa o amor afeição, amizade, o amor entre amigos, a simpatia pessoal, que se preocupa com a ou as pessoas, com a Pátria.
3. Agápe
Refere-se à classe de amor mais elevado, pois é um amor por vontade e não por emoção. É um sentimento superior às fraquezas e imperfeições humanas. É um amor que leva em conta os sacrifícios pessoais.
Esta última classe de amor é aquele com que Deus “amou o mundo” (João 3:16), e com o qual os cristãos devem amar o inimigo (Mateus 5:44), caracterizado pela misericórdia, bondade, cuidado, interesse e entrega total, como foi provado com a morte de seu Filho Jesus. É o amor desprendido de todo o egoísmo ou desejo carnal. Actua sem que primeiro seja activado.
Há muitos tipos de amor, como o filial, que se limita-se à família, ou matrimonial que garante a estabilidade do lar. Mas o amor cristão ultrapassa todos os demais, porque não conhece limites humanos. O amor é a essência da mensagem cristã. Deus é amor (I João 4:8-9) e Ele amou o mundo (João 3:16).
Vejamos a prioridade do amor (1-3)
a) O amor é essencial à vida do crente. Cinco vezes em três versículos Paulo usa a palavra “que” para indicar uma frase condicional. Um crente que tem e exerce dons do Espírito sem amor está perdido. Um crente pode ter a razão do seu lado, e faltar amor em suas acções.
b) Três vezes Paulo diz “e não tivesse amor”. As três coisas que Paulo reprova como não tendo nenhum valor sem o amor, são todas coisas que “engrandecem a pessoa”, alimentando o amor próprio, mas não podem substituir o amor:
- ainda que eu falasse... (1).
- ainda que eu tivesse... conhecesse... tivesse... (2).
- ainda que eu distribuísse... entregasse... (3).
Vemos, assim, que a coisa mais importante não é qual o dom que se tem, mas o amor que se tem.
c) Há expressões de Paulo muito fortes ao terminar cada versículo: “seria como o metal que soa ou como o sino que tine” (1), “nada seria” (2), “nada disso me aproveitaria” (3). A pregação sem amor nada mais é que ruído, oração sem amor é falar no vazio e ofertar sem amor é só cerimónia.
Paulo, nos versículos 4 a 7 menciona 15 características do amor cristão, referindo-se às suas qualidades negativas e positivas:
1. Qualidades negativas
a) O amor não é invejoso (4)
Invejar é ficar pesaroso pela prosperidade de alguém ou pela alegria de alguém. É desejar possuir alguma coisa que o outro possui, como por exemplo, a roupa, o carro, a casa, o corpo.
A inveja é uma das manifestações do egoísmo, chegando a levar a pessoa a cometer até crimes morais ou físicos para destruir ou possuir o bem alheio. Quem ama não se importa se outros recebem maiores bênçãos, mas se alegra com as bênçãos que os outros alcançam.
b) O amor não se vangloria, não é leviano (4), isto é, o amor não é vaidoso, não quer o centro das atenções, não faz questão de ser notado. Não mostra ostentação. O amor não busca glória para si mesmo. Quem ama é prudente e cuidadoso no trato com as pessoas de forma que ninguém venha a ser prejudicado.
c) O amor não se ensoberbece (4), isto é, quem ama não se torna inchado, arrogante, orgulhoso, exigindo coisas para si, não se torna importante. Quem nada pode ver além daquilo que faz, não tem amor. Deve ser humilde. Não se enche de importância porque sabe que o que é, e o que tem, deve-o a Deus e aos outros (Tiago 4:10; I Pedro 5:6).
d) O amor não se porta inconvenientemente (5), isto é, não se porta de modo vergonhoso, indecente, grosseiro. O amor evita atitudes que sejam inconvenientes, que possam trazer vergonha.
Tem um carácter recto, puro, cortês, bem educado. Não é rude, brusco ou grosseiro. Não injuria, nada faz que possa escandalizar. Sabe pedir desculpa e perdoar. Onde há o amor os cultos e as reuniões são reverentes e ordeiros.
e) O amor não busca os seus interesses (5), isto é, quem não é egoísta, antes procura ser útil aos outros e busca o seu bem. Não procura a satisfação de seus desejos sem levar em conta os sentimentos alheios. Não busca seus direitos e interesses se outros vierem a sofrer por isso. O egoísta não ama nada, excepto a si mesmo (10:24,33; II Timóteo 3:2; Filipenses 2:4)
f) O amor não se irrita (5), isto é, não se torna violento, não agride com palavras nem com atitudes. Não se melindra. Não é grosseiro. Não aceita provocações. Não guarda, como um livro de contabilidade, o mal dos outros. Quem ama alcança ponderação e calma no trato de qualquer problema. Não perde o equilíbrio. Não dá lugar à provocação.
g) O amor não suspeita mal (5), isto é, não atribui más intenções à acção do próximo. Procura confiar nele. Não é desconfiado, não pensa mal, não guarda rancor nem ressentimento, porque quem ama é incapaz de julgar mal seus irmãos. Pode fazer perguntas, mas nunca acusações. Sem amor estamos prontos a pensar o mal.
h) O amor não se alegra com a injustiça (6), isto é, não se alegra com o mal que uma pessoa pratica. Também não se alegra com o mal que vem sobre uma pessoa. A injustiça é uma ofensa ao direito de uma pessoa.
Quem ama não sente prazer em praticar a injustiça, nem tem prazer quando algum mal desaba sobre o próximo, especialmente se é vítima de injustiça. É diferente dos ímpios, que se gabam de seus feitos.
2. Qualidades positivas
Deixando por agora uma lista de aspectos negativos, Paulo começa a mencionar alguns positivos
a) O amor é sofredor (4), isto é, é paciente, longânimo. Não é um sinal de debilidade, mas de força. Quem realmente ama está pronto a suportar com paciência provas, situações difíceis, adversidades, necessidades, dores, perseguições, injustiças, falsas acusações, calúnias, aquilo que as pessoas fazem e que não lhes agrada, sem murmurar e sem perder a fé (I Tessalonissenses 5:14; II Pedro 3:9).
b) O amor é benigno (4-5), bondoso, isto é, faz sempre o bem, mesmo quando o outro lhe faz mal. Quem ama é bondoso, brando, benévolo para com os outros, pronto e disposto a servir em todas as situações. Não se atém à vingança.
c) O amor se alegra com a verdade (6), isto é, quem ama repele tudo quanto é falso, ainda que em prejuízo próprio. Sente um prazer imenso quando verdade e justiça estão imperando. Os julgamentos do amor são feitos à luz da verdade, e não nos momentos de ira. Sabe que a verdade é de Deus (Efésios 4:15).
d) O amor tudo sofre (7), isto é, quem ama está pronto a suportar com paciência qualquer afronta, oposição, calúnia, difamação, injustiça e provação, sem perder o ânimo e sem odiar as pessoas que provocam tais sofrimentos.
Sobrevive à tristeza, à decepção, à indiferença. O amor também tolera as fraquezas do outro.
e) O amor tudo crê (7), isto é, aquele que ama confia, acredita no próximo e sua opinião sobre a pessoa muda somente quando houverem provas concretas das más intenções do outro ou quando vê que o outro agiu erradamente.
Não é movido por qualquer rumor, suspeita, ou dúvida. Não desconfia antes de tempo. A pessoa que realmente ama crê nas promessas de Deus.
f) O amor tudo espera (7), isto é, não é pessimista. Está firmado na esperança naquele que ama e busca soluções para os problemas de relacionamento com as outras pessoas. Quem ama tem sempre esperança de que a outra pessoa possa melhorar.
Não espera passivamente, mas toma providências para se ajudar no melhoramento e na salvação do próximo.
g) O amor tudo suporta (7), isto é, o que ama é paciente e pode enfrentar as dificuldades com confiança, passando por cima dos conflitos e oposições. É capaz suportar a carga, por vezes bem pesada, sem murmurar e tem tranquilidade suficiente para enfrentar as aflições do desespero. O amor nos dá poder duradouro para sofrer, suportar e logo chegar à vitória.
Há estágios de crescimento dentro da época de imperfeição em que vivemos até à volta de Cristo (11). Depois que a Igreja começou houve um período de imaturidade, durante o qual os dons milagrosos foram necessários para o crescimento e a autenticação (Hebreus 2:3-4).
Com a crescente maturidade da Igreja, o dom da profecia (10), o dom da ciência (10) e o dom do conhecimento ( 8 ) desapareceriam bem assim todos os outros dons milagrosos.
O amor não falha nem cessa (8-13). Tem existência eterna. Os dons espirituais mesmo têm limites. Acontecem por um período maior ou menor de tempo, depois são retirados. O amor, entretanto, permanecerá ( 8 ), porque:
1. O amor não tem limites
O amor cristão genuíno ultrapassa as fronteiras da ciência, da cultura, da caridade e da profecia. Está fundamentado no amor de Cristo, que excede todo o conhecimento humano.
2. O amor aguenta tudo
Não há mal que o amor cristão não perdoe. Um coração carnal tem dificuldade em perdoar: requer paciência, humildade e muitas outras virtudes. O amor sintetiza todas as virtudes.
3. O amor permanece para sempre
Tudo quanto nos é oferecido pelo mundo é transitório. Mas o amor é eterno, porque Deus é eterno e a Bíblia diz que “Deus é Amor”. Esta é a virtude mais preciosa de quantas podem adornar a alma humana.
- Mangualde, Janeiro de 2001
Júlio Sérgio Felizardo